Para o uso sustentável da água, é preciso gestão eficiente da demanda e mudança de comportamento


 Cada vez mais enfrentamos o risco de sobrevivência em longo prazo se não conseguirmos compreender plenamente mudanças na população, o consumo e desperdício, a escassez de recursos, principalmente a disponibilidade de água limpa e segura. A redução desse risco implica em mudarmos para um comportamento mais sustentável. Ou seja, praticar ações para proteger, preservar e recuperar a água doce, essencial à vida.
Como fazer isso se 95% da população vive no “piloto automático” e passam o dia a dia sem prestar muita atenção à sua volta:“Tô nem aí!” “Eu pago a minha conta.” “Nem me lembrei de fechar a torneira”. Só nos damos conta do valor e da importância da água quando ela realmente falta.Existe um mito que basta “conscientizar” para mudar um comportamento. Todos já somos conscientes que cigarro provoca câncer. Daí, parar de fumar...
A educação ambiental, que é muito utilizada, é uma ferramenta limitada para que se use a água de forma mais responsável, numa comunidade, numa empresa ou condomínio residencial por exemplo. A educação ambiental, funciona principalmente em grupos de pessoas que já estão propensas a mudar para um comportamento mais sustentável.
Para uma gestão eficiente da demanda da água, temos que trabalhar em duas frentes importantes:
a) De forma estruturante provendo a comunidade, empresa ou condomínio de tecnologias que ajudem uma gestão mais racional da água: Sistemas de reuso, como captação e/ou tratamento de água de chuva, medição individualizada de água em condomínios, controle de vazamentos, substituição de descargas que gastam muita água, temporizadores ou redutores de vazão em chuveiros e torneiras e constante busca de fontes alternativas de abastecimento. 
b) Não estruturante, ou seja, tem a ver de como as pessoas se comportam ao lidar com a água no dia-a-dia. Isso implica em mudança de comportamento. Reduzindo tempo de banho, reusando as águas servidas para limpeza bruta (oriundas de sistemas de ar condicionado ou de maquinas de lavar, por exemplo). Entretanto, a mudança para um comportamento mais sustentável é a parte mais difícil de se implementar entre os usuários da água se não houver uma investigação anterior de percepção do quanto e como as pessoas estão dispostas ou sabem como usar a água de forma mais responsável. Por exemplo, os jovens adoram banhos mais longos, comprovadamente. Então, convencê-los a reduzir o tempo do banho... As crianças são mais fáceis de assimilar novos comportamentos. Lavar uma calçada com mangueira, não só afastar a sujeira. É também uma forma de reduzir o estresse numa cidade inóspita de concreto e asfalto. Nossa relação com a água não é “racional”. É biológica, lúdica e comportamental. Não costumamos ler ou procurar entender todas informações de consumo existentes numa conta de água. 
Assim como criamos ou temos barreiras e grandes motivações para aumentar o consumo, temos barreiras e baixas motivações para reduzir o consumo ou consumir a água de forma mais sustentável. Como já citado, nossa relação com a água é biológica e lúdica e a maioria se comporta no “piloto automático”. 
O professor e filósofo colombiano Antanas Mockus[1], classifica as motivações das pessoas de acordo com os três sistemas de regulação usados pela sociedade contemporânea: Lei, moral e cultura. 
De acordo com essa teoria nos comportamos socialmente: 
1. Por respeito ou medo da sanção legal – multa ou cárcere – 
2. Pelo código de conduta moral que trazemos de casa – Se aprendi que não devo desperdiçar água, provavelmente, sentirei “culpa” ao desperdiçar 
3. Se não existe controle ou desagravo social pela comunidade que estou inserido, não me sinto motivado a mudar o comportamento. 
Mockus enfatiza que, se conseguirmos alinhar esses três fatores, lei, moral e cultura, se reduzirá boa parte das barreiras para mudança social visando o bem comum. Portanto, facilitando o pacto social para se adotar um comportamento mais sustentável. 
Para concluir. Na questão do uso responsável da água é preciso fazer a gestão eficiente da demanda procurando mudar comportamentos não sustentáveis. A educação ambiental e o marketing social são ferramentas para atingir o grupo de pessoas que estão propensas ou não a mudar para um comportamento sustentável de uso da água. O grupo que "não está nem aí" terá que ser convencido pelo uso da tecnologia (medição individualizada da água, temporizadores ou redutores de vazão da água por exemplo – quando técnica/economicamente possível), da educação, do marketing social e, principalmente aplicação da norma, (lei), multa (dissemos de forma popular, que somos mais sensíveis no bolso)  e, principalmente, de desagravo do corpo social onde esse grupo está inserido. Entretanto, antes de implantar novas tecnologias ou fazer do uso da educação ambiental e campanhas de marketing social, seja para uma comunidade, o público interno de uma empresa ou moradores de um condomínio, pesquise quais são as barreiras, motivações, intenções de mudar e as limitações cognitivas ou técnicas para adoção de um comportamento mais sustentável de uso da água. 
A partir dessas respostas se poderá montar um programa eficiente de gestão da demanda da água. 

Gilmar Altamirano é publicitário consultor de marketing social, especialista em meio ambiente e sociedade, um dos fundadores e atual diretor presidente da OSC Universidade da Água www.uniagua.org.br @universidadedaagua

[1] https://vdocuments.site/documents/cultura-ciudadana-mockus.html

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